23/11/2014

[CINEMA] Crítica: Interestelar (2014)

Avaliação: 6,0 (de 10,0)

Interstellar, 2014. Direção: Christopher Nolan. Elenco: Matthew McConaugheyAnne HathawayMichael Caine. 




Admirado por uns e duvidado por outros, Christopher Nolan é inegavelmente um dos grandes diretores da atualidade. A ótima sacada em Amnésia (2000) foi a narrativa invertida que engrandecera um plot simplório, tornando a trama bem mais atraente e envolvente. Já em 2012, Nolan entregou o suspense policial Insônia, que até o momento, foi o seu projeto mais modesto, mesmo assim, ótimo. Porém, foi com a trilogia Batman que o cineasta se consagrou. Aliás, não só se consagrou, mas como também ditou moda, servindo como referência para vários outros filmes de ação e/ou super-heróis subsequentes.

Com todo o sucesso dos dois primeiros "Batman's" e holofotes virados para si, Nolan sentiu-se inspirado para almejar vôos bem mais altos com projetos mais audaciosos. O primeiro deles foi "A Origem", explorando o mundo dos sonhos utilizando-se de um roteiro pretensioso (até demais). O problema é que a realização em si ficou aquém de toda a pretensão, deixando o resultado final com uma ingrata sensação de vazio. O segundo, finalmente, foi este a qual falamos hoje: Interestelar.

Assim como em "A Origem", Nolan são soube ponderar a equação pretensão x realização, esta mais importante do que as equações físicas e matemáticas que tanto aparecem dentro da trama e que pouco têm a dizer para espectadores leigos no assunto, como eu. A boa notícia é que "Interstellar" possui elementos mais interessantes e melhores abordados do que "Inception", embora isso não queira dizer que o filme seja ótimo. Um desses elementos é relacionado com a relatividade do tempo e como somos impotentes perante sua inevitabilidade (o choque que o filme nos submete logo após a equipe chegar no primeiro planeta após cruzarem o buraco é algo que dói na alma!). Outros desses elementos são os belos efeitos visuais e a eficiente trilha sonora que contribui para o processo de imersão e tensão da história. Dentre os méritos, não posso deixar de citar ainda a atuação de Matthew McConaughey como protagonista que, mais uma vez, se engrandece na tela e mostra o porquê de ser considerado um dos melhores atores que o cinema possui hoje.

Falando agora dos deméritos, o principal deles é o próprio roteiro. Quando a obra chega ao fim, num primeiro momento podemos ficar vislumbrados seja pelas mensagens, alusões ou pelo espetáculo técnico, porém ao processar horas depois, o que vimos de maneira mais racional e crítica, percebemos o quão comum e esquemática é a história: começa focando nas relações interpessoais para que isso dê um impacto emocional mais adiante, parte para uma viagem cheia de mistérios, reviravoltas (sendo a maioria delas previsíveis) e conflitos internos, se concluindo de maneira apoteótica e demagoga.

É também interessante observar que ao mesmo tempo que o filme tenta nos passar a ideia da grandeza imensurável de toda a existência, alguns acontecimentos mostram exatamente o contrário: em certo momento da fita um dos personagens perde sua nave, fica desacordado, vagando solitário e inconsciente pelo espaço e posteriormente, sem maiores explicações, é resgatado são. Usar o pretexto de ficção científica para menosprezar a inteligência do expectador, fugindo de qualquer compromisso com a coesão, não pega bem, muito menos para um cineasta que se preocupa tanto em explicar fatores científicos irrelevantes para a história de maneira tão didática.

Mesmo possuindo seus altos e baixos, "Interestelar" é um filme interessante e que vale a pena ser conferido. O que fica claro, pelo menos para mim, é que capacidade é algo que Nolan já demonstrou ter principalmente em seus projetos mais "simples", faltando desenvolver destreza e sensibilidade suficientes para transformar suas grandes ambições em resultados a altura delas.





21/11/2014

Vitimismo e meritocracia

Ler comentários postados em redes sociais e portais de notícias vem sendo tarefa cada vez mais amarga. A ignorância, o preconceito, a desonestidade intelectual e o excesso de Ad Hominem estão se propagando de tal maneira que é preciso ter um estômago muito forte para suportar.



A nova modinha é a utilização da palavra "vitimismo" para minimizar os preconceitos sofridos por grupos minoritários e oprimidos. Se um negro reclama que sofreu racismo ele está se vitimizando. Se um homossexual foi agredido por razões homofóbicas, também está querendo se fazer de vítima. O mesmo acontece com um miserável que reclama por não ter o que comer: "Enquanto ele se vitimiza, poderia estar trabalhando e ganhando seu sustento".

Essas acusações de "vitimismo" quase sempre são acompanhadas pela inversão entre oprimido e opressor. Em um caso de racismo, onde uma pessoa negra foi insultada de "macaco", por exemplo, aparecem vários brancos "argumentando" coisas do tipo "ah, me chamam de branquelo, então também sofro preconceito". Quando um gay apanha, é morto ou sofre preconceito, são frases como "milhões de héteros apanham ou morrem todos os dias. Isso é heterofobia?" e "não se pode nem ter uma opinião hoje em dia. Daqui a pouco vai ser crime ser hétero (rsrs)" ou até mesmo "apanhou porque deveria ter mexido ou estar se pegando em público!" que ganham destaque pela classe média branca-cristã-hetera que deve sofrer muita discriminação no dia-a-dia.

Os números que comprovam o "vitimismo" dos negros. Fonte: Wikipedia.


Os preconceituosos estão adotando essas estratégias para exercerem seus preconceitos. A defesa da liberdade de expressão (só para eles), a inversão da opressão e a santificação do preconceito (não sou quem diz, mas sim a Bíblia!!) demonstram o quão ridículas essas pessoas e seus argumentos são. Chega a ser engraçado elas chamarem opressão de liberdade de expressão e serem contraditórias com o próprio termo ao não aceitarem opiniões contrárias. Quando utilizam o termo "vitimismo", essas pessoas ignoram que, na verdade, elas próprias estão se fazendo de vítimas. Grupos como os negros e LGBT's são vítimas de preconceitos históricos que, infelizmente, continuam acontecendo até os dias atuais. As provas disso são evidentes: quantas pessoas negras moram em bairros nobres e quantas em favelas? Se existirem dois suspeitos de um crime, sendo entre um branco e outro negro, de quem as autoridades e a sociedade mais desconfiará? Quanto aos heterossexuais, sofrem hostilização nas ruas pelo simples fato de serem héteros? Casais héteros são repreendidos quando estão se beijando em público? Existem pessoas que se acham no direito de limitar as liberdades individuais de héteros, como com quem e como podem se casar, se podem ou não adotarem filhos? Não é inegável que um homossexual, ainda mais o afeminado, seja mais vulnerável nas ruas do que um heterossexual?

Portanto, se você é branco, heterossexual, classe média e cristão e ainda por cima acha que está sofrendo opressão por parte de minorias, parabéns, tu és um grande ignorante e desonesto intelectual. Saia dessa bolha e veja o mundo com os olhos da realidade, afinal quem dera se não existisse mais racismo, homofobia, machismo, etc. e estas pessoas apenas se fizessem de vítimas.

O mais triste é que tem gente dentro desses grupos minoritários que sustentam esses argumentos. Estes me fazem crer que ou não conhecem a si próprios ou possuem uma mentalidade tão vulnerável a ponto de aceitarem e apoiarem seus opressores para se autoafirmarem e se sentirem mais "inclusos" dentro da sociedade. Como afirmou Simone de Beauvoir: "O opressor não seria tão forte se não tivesse cúmplices entre os próprios oprimidos."



Por fim, chego no assunto da meritocracia, outra expressão que está na moda, que não passa de uma mera utopia. Para se haver mérito, todas as pessoas inclusas na sociedade deve possuir as mesmas oportunidades e sem a ocorrência de desigualdades sociais. Dentro de um grupo, vamos supor de um milhão de pessoas, se uma pessoa não tiver as mesmas oportunidades do que o restante do grupo, a meritocracia já se torna uma filosofia falida. Se a meritocracia não pode ser "justa" e sustentável nos países mais ricos, quem dirá num país como o Brasil, uma nação que está ainda muito longe até mesmo de chegar perto da erradicação da pobreza. Afinal, como considerar que uma pessoa pobre, que estudou em uma instituição pública de péssima qualidade e outra pessoa, rica que os pais pagaram para ela estudar na melhor instituição de ensino da cidade, terão as mesmas oportunidades na vida? A meritocracia, aliás, muitas vezes não consegue ser sustentada nem em empresas, onde os bajuladores costumam possuir mais chances de crescimento do que quem realmente é bom funcionário.

Criticar os programas sócio assistenciais em defesa de uma sociedade meritocrática só evidencia o quanto a pessoa é ignorante com relação a estruturação social e egoísta a ponto de querer enxergar somente o que ela quer ver, no caso, o próprio umbigo. Em tempos reacionários, defender justiça social é um cansativo trabalho de paciência. Felizmente, ainda me resta um pouquinho.

18/11/2014

[CINEMA] Crítica: Cães de Aluguel

AVALIAÇÃO: 9,5/10,0.

Reservoir Dogs, 1992. Direção: Quentin Tarantino. Elenco: Michael Madsen, Chris Penn, Harvey Keitel,  Tim Roth.

Texto publicado em 19/01/2013 no site CinePlayers.

O surgimento de um mito. Se fosse para resumir o primeiro trabalho de Quentin Tarantino como diretor em uma frase, seria essa.

Em "Reservoir Dogs", o diretor mostra, de maneira bem clara, sua oposição aos clichês hollywoodianos e com sua personalidade cinéfila, conduz um plot aparentemente simples e batido em um filme que enche os olhos. Logo em seu início, o longa incorpora os temas que virariam marcas registradas do cineasta: excessivo uso de diálogos e referências à “cultura pop”. Momentos antes de roubarem diamantes em uma loja, os “cães” estão reunidos em uma lanchonete debatendo sobre músicas da Madonna e discutindo sobre o porquê de dar ou não gorjetas às garçonetes. E por incrível que pareça, esses diálogos são divertidos, passando bem longe de causarem tédio, por mais que não tenham qualquer relação com a trama central.

Com o decorrer do filme, percebemos que a narrativa não segue a ordem cronológica comum. Então conhecemos uma outra característica do diretor: fugir do convencional. Qualquer outro cineasta de desdobraria para executar a cena do roubo aos diamantes.
Tarantino ignorou isso, filmando apenas os acontecimentos anteriores e posteriores ao evento, mostrando que o roubo em si não tem importância alguma para a história. Os personagens e seus instintos, esses sim são importantes. E as consequências são mais do que importantes: são oportunidades para que tudo vire um show de ânimos exaltados, egos inflados e sangue derramado. Ah, por falar em sangue, eis outro elemento que se tornaria sua marca registrada, e sem moderações.

O roubo não deu totalmente certo. Um dos cães era um tira traidor. Alguns morreram, outros se feriram. Tarantino faz sua própria versão de “Quem é o traidor?”. E quando digo “sua própria versão”, preciso explicar mais alguma coisa? Não se há preocupação alguma em revelar este segredo ao espectador apenas no final. Pelo contrário, todas as pistas são dadas de cara. A história não precisa se prender nos habituais segredos. O segredo é jogado na nossa cara, para podermos nos divertir observando os personagens se debaterem na dúvida até o fim.

Para entrar no mérito de atuações e parar, por um pequeno momento, com os inúmeros elogios ao condutor do filme, até o canastra Michael Madsen consegue fazer uma boa participação. Mas são Harvey Keitel e Tim Roth que roubam a cena como Mr. White e Mr. Orange, respectivamente. “Não acredito que ela me matou, Larry!”.

Cada detalhe faz de “Reservoir Dogs” uma obra-prima. Desde o já mencionados, até a escolha dos apelidos personagens (usando nomes de cores), a ambientação, a hilária história do banheiro e o final, que é um dos mais humanos da história do cinema. Quentin Tarantino faz um filme para agradar suas próprias paixões, sendo esse, talvez, o principal motivo para o seu sucesso. Originalidade, ousadia, precisão, despirocagem, loucura… Poderia escrever um livro de 500 páginas para descrever as peculiaridades deste grande diretor e este seu primeiro trabalho, mas, nesse momento, prefiro parar por aqui.

[CINEMA] Crítica: Onde os Fracos Não Têm Vez

AVALIAÇÃO: 7,5/10,0

No Country for Old Men, 2007. Direção:  Ethan Coen, Joel Coen. Elenco: Tommy Lee Jones,  Javier Bardem, Josh Brolin.




Texto publicado em 11/11/2012 no site CinePlayers.

"Adaptação do livro de Cormac McCarthy, obra dos Irmãos Coen entra na lista dos filmes mais supervalorizados da história do cinema."

Alguém acha uma maleta cheia de dinheiro e o verdadeiro dono dela vai em sua busca, em uma caçada de gato e rato. Este argumento, por si só, já é batido demais. Porém, os Irmãos Coen colocaram uma pitada de "os tempos mudaram" em sua narrativa, sob o ponto de vista de um velho (e incompetente) Xerife, para tentar fugir do clichê. Isso seria bem interessante se fosse melhor explorado, uma vez que só se evidencia no começo e no final da trama.


Para piorar, o desenvolvimento do filme é carregado de falhas. Chega a ser patético o fato do bandido Chigurh (Javier Bardem) encontrar Llewelyn Moss (Josh Brolin), o portador da maleta, em qualquer lugar. No início, tal fato é justificável devido a maleta ter um localizador escondido, mas e depois que o mesmo é descoberto e retirado dela? Sem falar que estou até agora sem entender a parte em que Moss esconde a maleta no duto ventilação de um hotel e depois pega outro quarto, fazendo uma tremenda gambiarra para retirá-la. Lembrando que até essa cena ele não sabia da existência do localizador. Outra interrogação que ficou em minha cabeça foi: por que diabos uns assassinatos são mostrados e outros não? Se o objetivo foi o de tornar a trama mais complexa, não funcionou. E a maneira pela qual o veterano Xerife Ed Tom Bell (Tommy Lee Jones) é inserida na história, leva o espectador a questionar sua competência, chegando atrasado nas cenas dos crimes e sem falar que, em certo momento, ele vê os bandidos fugindo e prefere parar para ver o que aconteceu do que persegui-los.


Mas há também muitos pontos positivos na obra dos Coen. O mais destacável é a magistral atuação de Javier Bardem, que dá um tom assustador ao seu mitológico personagem, e faz muitos estragos apenas com um tubo de pressão para matar gado. A interpretação de Bardem e a caracterização de seu personagem faz o mesmo entrar na lista dos melhores vilões da história do cinema. O Oscar de melhor ator coadjuvante foi merecidissimo ao contrário dos outros 3 que o longa foi premiado. Falando em atuações, é sempre muito bom ter Tommy Lee Jones no elenco. Aqui, apesar de achar que o mesmo foi mal aproveitado, sua presença dá um charme a mais. Josh Brolin dá para o gasto, em uma atuação que não exige muito. O filme também contém alguns, digo alguns, diálogos interessantes e reflexivos. E quando existe o nome de Roger Deakins envolvido numa produção é certeza que temos uma fotografia magnífica e aqui, colabora para aumentar o tom sombrio e de suspense em algumas cenas. A mais memorável delas é a que Moss está em um hotel, percebe que Chigurh está lá, apaga a luz e fica com a arma apontada para a porta, observando os vultos do corredor pela soleira. Esses pontos salvam a produção do pior.


Quando o filme acaba (e por sinal o final é muito fraco), ficamos com a sensação de que "Onde Os Fracos Não tem Vez" poderia ter sido bem melhor. O rascunho é excelente, apesar da historinha clichê, mas contém furos gritantes de desenvolvimento. Existem detalhes no cinema que podem ser ignorados com facilidade e infelizmente isso não acontece aqui.
Talvez, o mais decepcionante foi ver este ganhar de "Sangue Negro" na disputa pelo Oscar de melhor filme. Definitivamente, a principal premiação de cinema do mundo não serve mais como referência de qualidade.

[CINEMA] Crítica: Corpo Fechado

AVALIAÇÃO: 7,5/10

Unbreakable, 2000. Direção: M. Night Shyamalan. Elenco:  Bruce Willis, Samuel L. Jackson,  Robin Wright .



No cinema, assim como é em qualquer outra área, ao se realizar um grande feito uma bagagem pesada é posta sobre as costas do realizador. Nesta bagagem encontram-se as cobranças e expectativas para o futuro. Shyamalan sentiu bem esse peso após nos presentear, em 1999, com o filmaço "O Sexto Sentido" ao entregar, um ano depois, "Corpo Fechado".

Para o bem e para o mal, Unbreakable apresenta inúmeras semelhanças ao sucesso anterior do cineasta indiano. Entre elas, as mais notáveis são a escalação novamente de Bruce Willis para o papel principal, a fotografia sombria, o ritmo lento, a paranormalidade e, claro, um final surpresa. Portanto seria impossível não comparar as obras entre si.

Willis mais uma vez comprova todo o seu talento em um papel dramático. Sua qualidade e carisma contribuem para que sua atuação seja o ponto mais alto da película. Os aspectos técnicos como a fotografia e tomadas de câmera bem sacadas funcionam novamente de maneira bem satisfatória. E mesmo com o ritmo da história fluindo de maneira lenta, Shyamalan consegue criar uma atmosfera envolvente o suficiente para que o espectador passe bem longe de bocejar. As referências aos heróis de quadrinhos são bem interessantes, assim como os detalhes bem bacanas perceptíveis caso seja apreciado com maior atenção (repare bem no personagem de Samuel L. Jackson e seu apelido).

Os problemas do filme se encontram exatamente em uma das suas estruturas mais elogiadas: no roteiro. O personagem David Dunn (Willis) sai como único sobrevivente (e sem nenhum arranhão) de um acidente de trem e começa a desconfiar, com a ajuda de Elijah (Jackson), que possui algo que o diferencia das outras pessoas. O desenrolar de descobertas posterior a este acontecimento faz emergir uma série de questionamentos na cabeça do espectador, sendo "como ele não percebeu isso antes?" o principal deles. Em outros momentos, o roteiro chega a ser esquemático (a parte em que Dunn cai na piscina foi a que mais me evidenciou isso). O final surpresa é um ótimo tempero para a obra no geral, mas aqui ele não chega a causar um impacto tão forte como foi em "O Sexto Sentido".

Portanto, mesmo com uma ótima atuação de Willis, uma apurada parte técnica, um interessantíssimo argumento e o final surpresa, "Corpo Fechado" se apresenta como uma obra menor (ainda assim muito boa), ainda mais quando posta ao lado de "The Sixth Sense". Essa comparação pode até parecer injusta, mas como disse no começo no texto, acaba sendo inevitável e justamente por isso sua recepção entre os críticos e espectadores foi tida com certa dose de decepção. 

17/11/2014

Vamos respeitar a fé alheia. Amém!

Como todos sabem, sou um ferrenho defensor das liberdades individuais e religião faz parte desse conjunto. Cada pessoa tem o direito de seguir e acreditar naquilo que quiser e/ou se identificar. O problema é quando a pessoa passa a interferir na liberdade de outrem.

Uma pessoa conhecida, católica, ganhou um pingente de uma santa e o utilizou para ir ao trabalho. Chegando lá foi duramente criticada por colegas evangélicas que disseram que a religião dela estava errada e que precisava conhecer a única religião "correta".  Infelizmente acontecimentos como este não são raros em nossa sociedade. Enquanto em determinados países a religião continua sendo motivo para guerras sangrentas, aqui temos uma guerra de preconceitos, intolerância e arrogância, o que considero tão pior quanto.

Se pesquisarmos fica fácil encontrarmos vídeos ou notícias de pastores evangélicos que ironizam outras religiões, sendo que alguns até mesmo chutam estátuas de santos e queimam livros de outras denominações e também de grupos que entram em igrejas católicas ou templos de outras religiões e praticam vandalismo no local e por aí vai. A tirania de certos integrantes da religião evangélica fica ainda mais evidente quando observamos a imposição de seus dogmas e ideologias dentro da política. Além de tudo isso, existem aqueles famosos líderes de determinadas igrejas protestantes que comercializam a fé de maneira escancarada.

Quando paramos para refletir em todas essas atitudes mencionadas fica fácil entender o motivo de haver tanta crítica e hostilização aos evangélicos por praticantes de outras doutrinas (inclusive os não praticantes, céticos). Quem planta intolerância, colhe intolerância. O que deve ser combatida é a generalização, pois existem muitos evangélicos que sabem respeitar e não invadem o limite individual de cada um, mas o fato é que os protestantes são os que mais discriminam e julgam a vida alheia. Sem falar que a própria denominação evangélica é rachada: se um pastor ou um simples seguidor da religião tem uma visão um pouco diferente, vários evangélicos falarão que ele é farsante e não é um "verdadeiro crente" (um exemplo mais recente é a declaração que o Pastor Caio Figueiredo deu no programa The Noite, do SBT, com relação aos homossexuais e prostitutas. Procurem no YouTube e leiam os comentários).

O irônico é quando o opressor tenta se fazer de oprimido. "Sofremos crentofobia! Estamos sendo discriminados!". Como já disse, não digo que os evangélicos tenham que aceitar a generalização, mas sim fazer uma reflexão e parar para pensar nas atitudes de vários membros da religião. A liberdade individual da religião tem de ser respeitada, mas a sua imposição é algo inadmissível. Eu tenho o direito de crer e seguir no que eu quiser, você tem o mesmo direito. Simples assim.

Logicamente, existem também católicos que desrespeitam gratuitamente outras religiões e impõe suas ideologias  e dogmas para a sociedade, mas aqui no Brasil e em outros países é evidente a dominância do desrespeito vindo por parte de evangélicos. Para acabar com a "crentofobia" só uma atitude vinda dos próprios crentes seria necessária: respeitar a crença do próximo. E antes que venham falar de liberdade de expressão, deixarei claro alguns pontos. O principal é que intolerância religiosa no Brasil é crime, mas infelizmente a Constituição é pouco utilizada para tal. O segundo é que, como todos sabem, a liberdade de expressão não é um direito pleno, portanto quando você fala o que quer é preciso aguentar as consequências do que foi dito. O terceiro e último ponto que vou ressaltar é a empatia: imagine, por exemplo, um espírita chegar em você e dizer que a sua religião está errada e que você precisa urgentemente ir a um centro espírita. Aposto que você não iria gostar, certo? Então saiba que quando você impõe suas visões religiosas a outras pessoas, elas também não gostam.

Existem dezenas, centenas ou, sei lá, milhares de religiões mundo afora. Querer discutir qual a única é a certa além de ser irrelevante (você segue determinada religião é óbvio que a julga como certa, assim como seu vizinho, seu chefe, seu tio, o padeiro)  é muito perigoso. Já parou para pensar na quantidade de vidas que já foram dizimadas por luta religiosa? E mesmo quando não há derramamento de sangue, já percebeu o quanto viveríamos melhor em sociedade se soubéssemos respeitar o quadrado do próximo?

"Fazemos isso pois queremos a salvação de todos!"
A salvação da sociedade só é possível perante a quebra de preconceitos, respeito e tolerância. Ao invés de querer levar seu parente espírita, ateu ou umbandista para sua igreja, olhe mais para você e tente fazer o bem de outra maneira. Afinal, o que mais se tem no mundo são pessoas famintas, crianças sem a alegria de ter um brinquedo, animais abandonados e por aí vai.